terça-feira, 9 de setembro de 2008

Curso Avançado de Formação de Voluntários da Saúde da Mama


Grupo de Apoio para familiares de portadores do TDAH

Encontro do Grupo de Apoio para familiares de portadores do TDAH -

Sábado, dia 13/09 às 14:30 na Sala 160 do Hospital de Clínicas em Porto Alegre.

A condução dos trabalhos feita pela Terapeuta familiar Lucia Helena Appel.

FOCO

Associação Porto-alegrense de Hiperatividade e Déficit de Atenção

quinta-feira, 4 de setembro de 2008

A POLÊMICA EM TORNO DAS DESTINAÇÕES DIRIGIDAS

O crescimento das doações de pessoas jurídicas aos Fundos dos Direitos da Criança e do Adolescente vem gerando discussões e interpretações conflitantes sobre a forma de utilização desse mecanismo.
O tema atrai atenção por envolver a possibilidade de direcionamento de recursos públicos para determinada área pelos próprios contribuintes, algo inédito na legislação brasileira até a promulgação da Constituição de 1988 e do Estatuto da Criança e do Adolescente. Por isto, o Ministério Público – órgão responsável por zelar pelos direitos da cidadania – passou a opinar sobre o assunto, ampliando um debate tradicionalmente protagonizado por órgãos como o CONANDA, Conselhos Estaduais e Municipais, ONGs, fundações e outras instituições ligadas ao setor. Entre outras questões, tem sido freqüente o questionamento da possibilidade de os destinadores virem a influir na escolha dos projetos que são apoiados com recursos do Fundo e do papel que cabe aos Conselhos nesse processo.
A discussão é complexa por envolver não apenas questões legais (por exemplo: que tipo de participação a legislação reserva aos cidadãos e às empresas no ato de doação de recursos ao Fundo dos Direitos da Criança e do Adolescente?), mas também técnicas (por exemplo: que fundamentos metodológicos devem justificar a aplicação de recursos do Fundo neste ou naquele projeto?) e políticas (por exemplo: em que medida a doação ao Fundo torna possível a participação democrática dos cidadãos no acompanhamento das políticas públicas do setor?).
Antes de tudo, vale lembrar que a participação da cidadania na definição de políticas para a área da criança e do adolescente está prevista no Estatuto da Criança e do Adolescente. Esta carta legal refletiu a diretriz explicitada no artigo 204 da Constituição, que determina a descentralização político-administrativa e a participação da população, por meio de organizações representativas, na formulação das políticas e no controle das ações em todos os níveis (federal, estadual e municipal) para as ações governamentais na área da assistência social. Assim, os Conselhos dos Direitos da Criança e do Adolescente (órgãos deliberativos, responsáveis pela formulação das políticas do setor nos níveis municipal, estadual e nacional) devem necessariamente ter composição paritária (com metade dos representantes sendo originários do poder público e a outra metade da sociedade civil).
Porém, a possibilidade de direcionamento de recursos públicos para os Fundos da Criança e do Adolescente pelos próprios contribuintes amplia a possibilidade de participação para um número de cidadãos muito maior do que aquele que tem assento nos Conselhos. Ao decidir conscientemente direcionar parte do seu imposto de renda devido para esta área, as pessoas físicas e jurídicas podem praticar o que foi adequadamente designado como uma forma de "civismo tributário". Mais do que isso, é de se esperar que a sociedade e os cidadãos, estimulados a contribuir para uma causa tão sensível da sociedade brasileira, queiram participar de forma mais ativa, buscando saber em que ações os recursos serão aplicados e até mesmo buscando dialogar com os Conselhos e organizações locais de atendimento sobre a finalidade das ações que serão executadas com recursos públicos em cujo direcionamento puderam influir. Ao mesmo tempo, também é provável que um mecanismo inovador desta natureza possa ensejar incompreensões e até mesmo desvios em tempos de relativa confusão entre os limites que devem demarcar interesses públicos e privados.
Doações casadas e doações dirigidas
Buscando apoiar ações voltadas a crianças e adolescentes, muitas empresas têm efetuado doações aos Fundos dos Direitos da Criança e do Adolescente e mobilizado seus funcionários para que façam tais doações. Para tanto, algumas empresas simplesmente procuram saber o número da conta bancária do Fundo e fazem sua destinação, limitando sua participação ao simples envio dos recursos financeiros. Outras buscam ir mais além, e solicitam aos Conselhos dos Direitos da Criança e do Adolescente a indicação de projetos que possam ser apoiados. Nesse processo têm ocorrido situações como:
1) Os Conselhos apresentam às empresas uma lista de entidades ou projetos; as empresas, seguindo critérios próprios, selecionam nessa lista uma ou mais instituições que deverão receber os recursos por elas destinados ao Fundo.
2) As empresas indicam aos Conselhos entidades que identificam como merecedoras de seu apoio e solicitam aos Conselhos que os recursos por elas destinados ao Fundo sejam posteriormente repassados a tais entidades.
Representantes do Ministério Público ligados à área da infância e da juventude vêm se pronunciando pela não legitimidade e até pela ilegalidade desses procedimentos de destinação. O tema chegou a ser debatido no XXII Congresso Nacional da Associação dos Magistrados e Promotores da Justiça da Infância e da Juventude, realizado em Florianópolis no último mês de abril.
Na visão dos promotores, os Conselhos dos Direitos da Criança e do Adolescente têm obrigação de elaborar planos de ação e de aplicação dos recursos do Fundo (ambos precedidos de estudo prévio, capaz de diagnosticar as demandas específicas locais), com previsão de receitas e despesas. Esses planos devem conter prioridades locais, metas, ações, recursos e prazos de execução, e não apenas listas genéricas de entidades e projetos. Mais do que isso, o Plano de Ação e de Aplicação de Recursos do Fundo deve constar, respectivamente, da Lei Plurianual, da Lei de Diretrizes Orçamentárias e da Lei Orçamentária, sem o que a simples resolução do Conselho dos Direitos não seria suficiente para ensejar a execução de determinado projeto.
Com efeito, entendemos que tal interpretação é correta e coerente com os preceitos do Estatuto da Criança e do Adolescente. Os Conselhos dos Direitos da Criança e do Adolescente devem dispor de diagnóstico com base na realidade local, fundamentado e documentado, que exponha com clareza as prioridades locais de defesa e promoção dos direitos da criança e do adolescente, os programas e projetos de atendimento (que, em seu conjunto, devem conformar uma política de atendimento) e os recursos financeiros, técnicos e humanos necessários para a implementação das ações propostas.
As prioridades locais de defesa e promoção dos direitos da criança e do adolescente devem ser hierarquizadas e o Plano de Ação deve estabelecer em que ordem e prazo os problemas detectados devem ser atacados. A hierarquização das prioridades é sempre necessária, tornando-se tanto mais decisiva quanto maiores forem a extensão, a complexidade e a diversidade do território, da população local e dos problemas de violação de direitos existentes na localidade. Tal diagnóstico deve conter não apenas a identificação dos problemas (ameaças e violações de direitos de crianças e adolescentes), mas também um mapeamento da situação da rede de atendimento (indo além de um simples registro de dados sobre as entidades locais, destituído de elementos de avaliação da qualidade dos seus serviços) de modo a permitir ao Conselho diagnosticar os recursos com os quais cada município conta (e aqueles que faltam) para atender crianças e adolescentes.
A indicação dos programas e projetos de atendimento (configurando uma política de atendimento) deve responder às prioridades diagnosticadas. Uma vez que todo programa ou projeto deve ter um agente executor (governamental e/ou não-governamental), faz-se necessário que o Conselho aponte quais serão as organizações executoras dos referidos programas e projetos. Caso não existam organizações disponíveis na rede de atendimento local para a execução de determinada ação (pois nem sempre cada município já contará com capacidade de ação instalada para atender prioridades diagnosticadas), o plano de ação deve prever ações e recursos que viabilizem a criação de um novo programa ou projeto, para cuja execução seja preciso instalar nova instituição executora ou ampliar/capacitar instituição existente. Em suma, o Conselho deve dispor de um Plano de Ação que não se resuma a uma relação de entidades e projetos, mas que indique com clareza os problemas que estão sendo atacados e a forma de atacá-los.
Do acima exposto não se conclui que os Conselhos não possam definir a priori (com base em diagnóstico) que um determinado projeto ou entidade deva receber recursos que venham a ser destinados ao Fundo, e tampouco que a sociedade e os destinadores não possam ser previamente informados de tudo o que foi consagrado no Plano de Ação após este ser deliberado pelo Conselho. O que importa é que o Conselho faça prevalecer a política de atendimento por ele traçada, empregando os recursos recebidos pelo Fundo para os programas mais importantes existentes.
Em coerência com o que foi exposto acima, não seria cabível admitir a possibilidade de os Conselhos transferirem aos destinadores o papel deliberativo que a Constituição e o Estatuto da Criança e do Adolescente lhes reservam. Isso configuraria o que os representantes do Ministério Público vêm designando como "doação casada" ou "doação dirigida".
Na "doação casada", o destinador (com a conivência ou estímulo do Conselho) faz uso do Fundo para fazer chegar recursos a uma entidade ou projeto de seu interesse. A prática pode ser considerada ilegal porque pode dar margem a que sejam atendidos interesses privados daquele que faz a doação e da entidade que a recebe, sem a garantia de que estejam sendo atendidas as prioridades expressas na Política de Atendimento. É evidente que tal possibilidade cresce diante da ausência de tal política, ou diante da omissão ou ignorância quanto à necessidade da formulação dessa política.
A "doação dirigida" (tal como, parece-nos, vem sendo subentendida na discussão corrente sobre o funcionamento dos Fundos) é aquela em que o Conselho simplesmente decide sobre o elenco de entidades ou projetos que poderão vir a receber recursos provenientes de eventuais destinações aos Fundos, e os apresenta aos destinadores como se fossem expressão de uma Política de Atendimento, facultando a estes a possibilidade de escolha no interior do elenco previamente autorizado. Para alguns analistas, esta conduta do Conselho é aceitável por configurar deliberação formal e sinalizar que o Conselho teria cumprido seu papel. Por seu turno, algumas empresas entendem ser importante poder escolher entre alternativas validadas pelo Conselho, o que geraria maior motivação para que seus funcionários façam destinações e se envolvam com os projetos apoiados.
A nosso ver, essa visão, embora bem-intencionada, é equivocada porque confunde "prioridade" e "oportunidade", além de subestimar a importância da formulação de Planos de Ação e Aplicação de Recursos dos Fundos que sejam adequadamente fundamentados. Esse equívoco foi descrito de forma bastante precisa em artigo de Márcio Rogério de Oliveira, membro da Associação dos Magistrados e Promotores da Justiça da Infância e da Juventude. Segundo este autor, ao aceitar que os destinadores escolham entidades ou projetos sem a garantia de que estejam sejam seguidos critérios de prioridades, os Conselhos abrem mão de parcela significativa de seu papel gestor e deliberativo. Nessa forma de destinação dirigida, fica muito difícil avaliar (pela falta de um diagnóstico mais abrangente e fundamentado) se os recursos empenhados num dado projeto poderiam ser aplicados com maior proveito e resultados em prioridades mais urgentes; basta que os recursos sejam utilizados e que tragam algum benefício para a população infanto-juvenil que já é atendida pelas entidades beneficiárias. Segundo esta lógica de mera oportunidade (apontada por Oliveira), os Conselhos aceitam projetos indicados pelos destinadores para não perderem recursos que, de outra forma, seriam direcionados para outras finalidades.
Doações casadas ou doações dirigidas (como definidas acima) não contribuem para o fortalecimento dos Conselhos de Direitos como conselhos gestores. Podem desvirtuar a razão de ser dos Fundos, na medida em que resultarem no apoio a iniciativas que, embora meritórias, não alcancem os públicos mais vulneráveis e não contribuam significativamente para a redução ou supressão dos problemas graves que atingem as crianças e adolescentes em cada localidade.
Oportunidade para o fortalecimento dos Conselhos e Fundos
Se o Conselho realizar um diagnóstico consistente da realidade local, nada impede, e é mesmo recomendável, que as prioridades expressas no Plano de Ação e Aplicação de Recursos sejam comunicadas à sociedade e discutidas com ela, pois assim os cidadãos poderão certificar-se de que as doações efetuadas ao Fundo serão corretamente dirigidas (isto é, destinadas a custear ações relevantes e prioritárias, previamente detectadas) e se sentirão seguros em continuar efetuando doações aos Fundos. Ademais, nada impede que, a critério das organizações executoras e consideradas as necessidades dos projetos, os cidadãos façam sugestões, participem voluntariamente dos projetos e contribuam de formas variadas para sua plena implementação.
Para desfazer equívocos que, a nosso ver, estão contidos no atual debate sobre destinações casadas ou dirigidas é necessário considerar que toda destinação efetuada ao Fundo por pessoa física ou jurídica deverá, posteriormente ao ato do envio de recursos ao Fundo pelo doador, ser "dirigida" (no sentido de ser "direcionada" ou "repassada", ou no sentido de ser "usada para custear despesas") às organizações que vierem ser indicadas pelo respectivo Conselho de Direitos para operar ações prioritárias. A questão decisiva não está no fato de a doação ser dirigida a uma ação, mas sim em dois aspectos cruciais: 1) quem toma tal decisão; 2) como são definidas as prioridades às quais o recurso doado será dirigido. A "destinação dirigida" será questionável se a decisão final não for do Conselho de Direitos e se este não demonstrar o fundamento real e legal das prioridades indicadas.
O primeiro aspecto (decisão do Conselho) é de simples determinação: pela lei, cabe ao Conselho de Direitos deliberar e apontar para quais prioridades (e em que ordem de prioridade), para quais ações e para quais organizações executoras deverão ser dirigidos os recursos do Fundo. Para que o segundo aspecto esteja garantido, é necessário que os Conselhos exerçam seu papel de Conselhos Gestores, sendo capazes de diagnosticar prioridades e formular políticas de atendimento, e não apenas de indicar listas de entidades aos doadores, sem critérios complementares que permitam definir uma ordem de prioridades para utilização dos recursos.
Realizar-se-ia, desta forma, um procedimento correto do ponto de vista técnico, do ponto de vista legal e do ponto de vista do exercício da participação democrática: os Conselhos são estimulados a diagnosticar e decidir, sem transferir tal responsabilidade aos doadores; dialogando com os Conselhos, os cidadãos-doadores exercitam uma participação voluntária significativa em sua comunidade e ajudam a criar condições para que as doações efetuadas tenham maiores chances de sucesso.
Diagnósticos locais: condição para a adequada aplicação dos recursos dos Fundos e o fortalecimento dos Conselhos
A criação de Conselhos de Direitos com função gestora e deliberativa pode ser considerada uma das principais inovações trazidas pelo Estatuto da Criança e do Adolescente. Por meio da ação coordenada e paritária entre governos e representantes de organizações da sociedade civil, espera-se que esses Conselhos possam aumentar a eficácia das ações de defesa e promoção de crianças e adolescentes, propiciar maior controle da sociedade sobre gestão dos recursos públicos e contribuir para o aprimoramento da democracia.

Texto enviado por PASTORINI ao nosso parceiro TONI PROENÇA.